O Brasil oficializou sua candidatura para sediar a edição de 2027 do Games of the Future, principal evento global dos chamados esportes figitais — que combinam competições físicas e digitais em um mesmo torneio. Em entrevista ao IA Brasil Notícias, Moacyr Alves Junior, CEO da Phygital Games Brasil, e René Fasel, fundador da Phygital International, falam sobre o potencial do país para receber o evento, destacam o engajamento do público brasileiro e explicam como a competição pode impulsionar inovação, turismo e a economia digital. Eles falam também como a IA pode ser usada na preparação dos atletas de esportes figitais.
Para quem ainda não conhece o Games of The Future, como você explicaria esse novo conceito que une esporte físico, e-sports e tecnologia em uma só competição?
René Fasel: O Games of the Future é um evento esportivo internacional anual que une o esporte físico ao universo dos games digitais, em um formato inovador chamado “esportes figitais”.
Considerado o principal evento do calendário figital, o Games of the Future reúne atletas e gamers de elite do mundo todo, que competem em formatos revolucionários em diversas modalidades, como Futebol Figital e Basquete Figital. As equipes primeiro se enfrentam em um videogame e depois partem para a versão real da modalidade. Por exemplo, no “Futebol Figital”, a competição começa com uma rodada digital, em um simulador de futebol, e é seguida de uma rodada no campo. A ideia é incentivar os gamers a também praticarem esportes físicos, promovendo saúde, inclusão e diversão.
Como surgiu a ideia de trazer esse evento para o Brasil? Em que estágio está a candidatura?
Moacyr Alves: A ideia veio da minha experiência organizando eventos de tecnologia e games no Brasil, como a Campus Party. Em 2024, participei do evento teste do Games of the Future, acompanhado da equipe brasileira de batalha de robôs. Lá, recebi o convite para liderar o comitê brasileiro na candidatura para sediar os Games of the Future em 2027.
Em janeiro, organizamos uma seletiva nacional que teve grande participação e engajamento, mesmo sem financiamento ou divulgação expressiva — o que mostrou o entusiasmo do público brasileiro com os esportes figitais.
A candidatura oficial foi estruturada e apresentada há algumas semanas, aqui em São Paulo, quando o senhor René Fasel e uma grande equipe da Phygital International, organizadora do evento, vieram avaliar nossa infraestrutura — hotéis, locais de competição, acesso a aeroportos e outros fatores importantes. Estamos concorrendo com países como Uzbequistão, África do Sul e Sérvia, mas temos um grande diferencial pela experiência em sediar eventos globais e pela paixão do brasileiro por todo tipo de competição esportiva.

Quais são os diferenciais e desafios de uma competição que combina performance física e habilidade digital?
René Fasel: O grande diferencial é a integração entre dois mundos distintos: o digital e o físico. Os atletas precisam se destacar tanto nos games quanto na performance esportiva, o que exige uma nova abordagem de treinamento e uma mentalidade competitiva diferente.
Embora algumas modalidades se beneficiem de arenas específicas e tecnologia de ponta, os esportes figitais são projetados para serem escaláveis e adaptáveis, garantindo acesso a uma variedade de comunidades e participantes. O principal desafio — e ao mesmo tempo uma oportunidade — é engajar atletas e público de forma completa, unindo a intensidade tática dos e-sports à emoção física do esporte tradicional. O resultado é uma competição dinâmica, inclusiva, acelerada e voltada para o futuro.
O que é mais exigido? A parte física ou a habilidade com o ambiente digital? Ou há um equilíbrio entre os dois?
René Fasel: Depende da modalidade, mas o equilíbrio é essencial. Um atleta pode ser excelente no digital, mas ter dificuldades na parte física se não estiver bem preparado, e o contrário também é verdadeiro.
Nos esportes figitais, a preparação precisa ser dupla: os participantes devem ter agilidade mental e pensamento estratégico, assim como resistência física, coordenação e condicionamento. Nosso objetivo é atrair atletas dispostos a encarar essa abordagem moderna e multidimensional do esporte.
Que tipo de impacto econômico um evento como esse pode gerar para o Brasil e para a América Latina?
René Fasel: O Games of the Future têm grande potencial para impulsionar o crescimento econômico local e regional.
Ao promover a inovação e atrair investimentos em ecossistemas digitais avançados, o evento ajuda a construir estruturas econômicas sustentáveis. Como evento global, gera benefícios imediatos para o turismo e a hotelaria, atraindo grande público internacional e cobertura midiática. O evento teste de 2024, por exemplo, recebeu mais de 300 mil visitantes em apenas 12 dias, o que demonstra seu impacto cultural e econômico.
Além disso, o torneio pode ser um catalisador de crescimento em setores como tecnologia, marketing, criação de conteúdo e infraestrutura digital — abrindo novas oportunidades de emprego e incentivando a educação voltada para habilidades da era figital. Isso cria um legado profissional e econômico duradouro para o país-sede.
Além do turismo e da movimentação financeira direta, há também um impacto em inovação e tecnologia? Como?
René Fasel: Sem dúvida. Os Games of the Future são uma vitrine global para tecnologias emergentes, aplicações de inteligência artificial e inovações em desempenho esportivo.
O evento serve como plataforma de lançamento para novos jogos e soluções tecnológicas, estimulando a colaboração entre startups, universidades e iniciativas do setor público.
Em edições anteriores, modalidades como corrida de drones e batalhas de robôs — raramente vistas em eventos multiesportivos — mostraram o compromisso dos organizadores com a inovação contínua. Com a edição deste ano marcada para dezembro nos Emirados Árabes Unidos, novas modalidades figitais ainda mais inovadoras serão anunciadas em breve, ampliando ainda mais as possibilidades desse formato dinâmico.
Como você avalia a aceitação do público tradicional dos esportes frente a essas novas modalidades?
René Fasel: Temos observado um interesse crescente por parte do público tradicional, que valoriza o componente físico adicionado à competição digital. Nosso modelo híbrido permite uma experiência compartilhada entre gerações com diferentes hábitos e preferências.
Um bom exemplo é a Kings League, que se tornou um fenômeno, reunindo grandes audiências online e comunidades de fãs dedicadas. Muitos atletas de elite já se envolvem com jogos digitais, e os torcedores hoje acompanham tanto o desempenho físico quanto a atuação de seus ídolos no ambiente figital. Nossa missão é unir esses mundos e oferecer experiências que atraiam um público diverso e multigeracional.

Já existem atletas, gamers ou equipes brasileiras classificados ou se preparando para os Jogos do Futuro?
Moacyr Alves: Sim, já temos várias equipes brasileiras competindo em diferentes modalidades. Nosso time de Basquete Figital conquistou o segundo lugar na edição de 2024 do Games of the Future, e hoje temos até jogador da Seleção Brasileira participando.
Estamos montando equipes altamente competitivas a cada edição, e tenho certeza de que a participação só vai crescer.
Como funciona o processo de seleção para quem quer disputar o torneio? Há planos para realizar torneios qualificatórios no Brasil?
Moacyr Alves: Os atletas e clubes se classificam por meio de eventos locais, como o Phygital Origins, seguidos dos torneios nacionais Phygital Rivals, realizados em diferentes estados, regiões e países, com critérios específicos para cada modalidade.
Os melhores colocados avançam para a fase Phygital Contenders ou se classificam diretamente para o Games of the Future.
No Brasil, já foram realizadas seletivas para a edição de 2025, que acontecerá em dezembro, nos Emirados Árabes Unidos. Vários clubes e atletas já estão classificados ou passaram para a próxima etapa.
As próximas seletivas, para a edição de 2026 no Cazaquistão, ocorrerão entre junho e dezembro deste ano em várias regiões do país.
Como você enxerga a evolução dos Jogos do Futuro nos próximos anos? Há planos de expansão de modalidades ou formatos?
René Fasel: Nosso objetivo é transformar o Games of the Future em um dos principais eventos esportivos globais. A resposta à edição teste de 2024 demonstrou um forte interesse pelo formato figital.
Nos próximos cinco anos, planejamos realizar mais cinco edições ao redor do mundo, com cada país-sede tendo a liberdade de introduzir novas modalidades a cada ano, contribuindo para a diversidade e relevância do evento.
Moacyr Alves: Se o Brasil vencer a candidatura para 2027, quero gerar um impacto semelhante ao da Fórmula 1. Pode parecer ambicioso, mas me dê dois anos e farei os esportes figitais explodirem em popularidade.

Como vê o papel da América Latina e do Brasil como polos de desenvolvimento para os esportes figitais?
Cada país pode escolher modalidades novas ou adaptar esportes já existentes. Se vencermos, um dos esportes que gostaria de incluir é o tênis adaptado, com regras mais divertidas e menos rigidez — diferente daquele ambiente silencioso e tradicional.
Moacyr Alves: A América Latina tem uma população jovem, conectada e muito engajada com tecnologia e esportes. O Brasil é destaque em várias frentes — produção de conteúdo, engajamento em transmissões e desempenho competitivo.
Também temos países fortes como Uruguai e Argentina. No ano passado, por exemplo, uma equipe sul-americana chamada Latino Gang participou do evento, representada pelo skatista argentino Matías Dell Olio, que também competiu nas Olimpíadas de Paris. Com o apoio certo, a presença e competitividade da região só tendem a crescer. Acredito que podemos nos consolidar como referência global nesse novo ecossistema.
A inteligência artificial está transformando o mundo dos esportes e dos games. Qual o papel da IA nos Jogos do Futuro e como ela pode potencializar a experiência dos atletas e do público?
René Fasel: A inteligência artificial tem um papel cada vez mais importante no Games of the Future. Ela pode ajudar desde a análise de desempenho dos atletas até a criação de experiências mais interativas e personalizadas para o público.
Com a IA, os clubes conseguem estudar partidas em profundidade, identificar padrões e até receber sugestões de melhorias em tempo real. Para os espectadores, a IA transforma a experiência, com recomendações personalizadas, interações dinâmicas e até traduções automáticas durante as competições. No fim das contas, a inteligência artificial aproxima ainda mais os mundos físico e digital, tornando toda a experiência mais acessível, justa e emocionante.
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